Estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM) aponta que, sem a fonte de custeio, o piso da enfermagem pode levar ao desligamento de quase ¼ dos 143,3 mil profissionais da enfermagem ligados à Estratégia de Saúde da Família (ESF) e à desassistência de 35 milhões de brasileiros. Estimativas da entidade mostram, ainda, que o piso deve gerar despesas de R$ 10,5 bilhões ao ano apenas aos cofres municipais.
Intimada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a apresentar, em até 60 dias, dados sobre os impactos da Lei 14.434/2022 aos Municípios, a Confederação vai entregar estudo completo à Corte com o intuito de apoiar a avaliação dos ministros nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222, que trata da suspensão dos pisos salariais profissionais para enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras.
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, destaca que o movimento municipalista reconhece a importância de valorizar esses profissionais, mas alerta para a inviabilidade no atual cenário e os efeitos da medida na prestação de serviços à população. “Não há que se discutir a importância dos profissionais da saúde, especialmente pelo que vivemos no enfrentamento à pandemia. Porém, sem que seja aprovada uma fonte de custeio, conforme o Congresso havia se comprometido, veremos a descontinuidade de diversos programas sociais, o desligamento de profissionais e a população que mais necessita desassistida”, afirma.
Programas federais
No documento, a entidade traz um panorama sobre os programas federais na área de saúde e como esses podem ser impactados pelo piso. A Confederação aponta que, dos 280 programas federais mapeados, 76 são da saúde. De acordo com o estudo, existem déficits de incentivos financeiros acumulados que chegam a cerca de 150% somente nos últimos dez anos.
Um exemplo é o incentivo destinado ao financiamento das equipes de Saúde da Família (eSF), principal eixo da Atenção Primária à Saúde. Atualmente, 5.563 Municípios integram o programa, que conta com 52.193 equipes credenciadas, além de representar uma cobertura cadastral de 153,8 milhões de pessoas, o que corresponde a 73,19% da população brasileira.
O impacto do piso da enfermagem, somente na estratégia Saúde da Família, será superior a R$ 1,8 bilhão no primeiro ano e, para manter os atuais R$ 6,1 bilhões de despesas com os profissionais de enfermagem, os Municípios brasileiros terão que descredenciar 11.849 equipes de eSF/eAP, representando uma redução de 23% no total de equipes.
Regiões mais afetadas
Entre as regiões do país, a região Nordeste será a mais afetada pelo piso da enfermagem, com impacto financeiro de R$ 939,3 milhões no primeiro ano de vigência. Estima-se que o conjunto de Municípios nordestinos terá de desligar 6.645 equipes da atenção primária à saúde (eSF/eAP), o que representa 37% do total de equipes credenciadas. Aproximadamente 17,9 milhões de nordestinos poderão ficar sem as ações e os serviços básicos de saúde; além disso, deverão ser desligados cerca de 17.963 profissionais da enfermagem.
O Estado mais afetado pelo desligamento de equipes é a Paraíba, com 49% das equipes podendo ser desligadas. Em seguida, estão Amapá (44%), Pernambuco (42%), Maranhão (41%) e Rio Grande do Norte (40%). Já em relação ao número de pessoas atingidas, em termos absolutos, Minas Gerais é o que apresenta o maior cenário, com 4,7 milhões de pessoas correndo o risco de ficarem desassistidas. Em seguida, estão a Bahia, com 4,2 milhões; e Pernambuco, com 3 milhões.
Populações vulneráveis
Mais de 500 mil habitantes assistidos por esses programas se encontram em condições de vulnerabilidade social, e poderão sofrer os impactos da medida, como: população de rua, ribeirinhos, quilombolas, indígenas e população prisional. Somente na Atenção à Saúde da População Prisional (eAPP) é estimado um impacto financeiro de R$ 6,2 milhões no primeiro ano com a implementação do piso da enfermagem.
Outra população vulnerável que deve ser afetada com a implementação do piso salarial da enfermagem é a ribeirinha, com mais de 500 mil usuários do SUS e que residem em localidades de difícil acesso. Contabiliza-se que, atualmente, são necessários R$ 15,9 milhões ao ano para manter as despesas com as remunerações dos profissionais de enfermagem. O impacto financeiro do novo piso salarial equivale a mais de R$ 7 milhões somente no primeiro ano.
Posicionamento CNM
Com a implementação do piso salarial da enfermagem, instituído pelo Congresso Nacional e pelo governo federal sem indicar ou prever fontes de recursos financeiros para custeá-lo, a manutenção dos programas federais se torna inviável, não restando outra solução para manter equilíbrio econômico e financeiro das contas públicas municipais senão a adequação dos quantitativos de equipes e programas.
Com este estudo, a CNM espera contribuir no debate da ADI 7.222 e trabalha para que os tomadores de decisões possam perceber a real situação dos Municípios. É importante para o gestor local a valorização desses e de outros profissionais do quadro municipal, no entanto, deve-se priorizar a sustentabilidade da gestão e o atendimento do cidadão nos mais diversos serviços.