Médico legista é fundamental em casos como do menino Henry

Dr. Carlos Durão: “o papel do legista é determinante, mas na maioria das vezes acaba por atuar tarde demais”

A morte do menino Henry Borel, de apenas 4 anos, que apresenta indícios de ter sido torturado pelo padrasto e com ciência da própria mãe, é mais um caso de atrocidade que choca o país e o mundo. A sociedade cobra das autoridades que fatos como esse sejam esclarecidos o quanto antes e que os culpados sejam punidos. Para que isso aconteça, o conhecimento do médico legista torna-se peça-chave. Pontos relevantes sobre essa área foram abordados em palestra on-line organizada pela Medicina Unoeste, na nesta terça-feira (13). O tema “Aspetos Forenses do Trauma” foi conduzido pelo Dr. Carlos Durão, diretamente de Lisboa, renomado médico ortopedista e legista em Portugal, que recentemente concedeu importantes entrevistas à mídia nacional sobre o laudo de Henry.

A atividade integra a programação do AMU, um projeto de extensão da Medicina Unoeste Prudente em parceria com a Associação de Médicos Legistas de São Paulo (Amlesp) e outras universidades. À frente da organização dos eventos está a Liga Acadêmica de Medicina Legal e Toxicologia Forense (Lamelt), da Unoeste.

O Dr. Carlos Durão é perito médico legista da Delegação Sul do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses de Lisboa. Durante a palestra, ele abordou os aspectos forenses e médico legais do atendimento ao trauma no serviço de emergência. “Aquilo que devemos saber para reconhecer para além dos aspectos médicos, elementos que podem ser úteis para uma futura investigação forense”, explica.

Sobre o caso Henry Borel, o perito pontua que, infelizmente, não é isolado, e lembra-se do crime semelhante que também acompanhou em Portugal, onde o pai e a madrasta da menina Valentina estão sendo acusados de matarem barbaramente a criança de nove anos, ocultando o seu cadáver. O Dr. Carlos destaca a revolta e a grande repercussão destes casos, justamente pela brutalidade contra uma criança indefesa. “Mas todos nós temos a noção que apenas identificamos a ponta do iceberg. Muitos outros casos, onde a violência acaba por não ser tão evidente, passam despercebidos”.

Por isso, o médico destaca que quando casos como esses são identificados, o profissional da saúde deve sinalizar para as autoridades competentes, para que estas possam agir em conformidade evitando assim um desfecho tão trágico como os mencionados. “O papel do legista é determinante, mas na maioria das vezes, o legista acaba por atuar tarde demais. É muito importante que qualquer médico, ao se deparar com uma criança ou jovem vítima de violência, possa reconhecê-la e não se omitir no seu dever legal. Foi assim com as médicas pediatras que observaram o menino Henry, pois foram as primeiras a sinalizarem que a história relatada era inapropriada”.

Quanto às primeiras versões apresentadas pela mãe e padrasto, o perito frisa que uma queda de um beliche pode provocar fraturas entre outras lesões, mas uma simples queda de uma pequena altura, como a relatada inicialmente, imediatamente levanta dúvidas que devem ser esclarecidas. Inclusive trouxe na palestra alguns aspectos da biomecânica do trauma que, segundo ele, é essencial para esclarecer o mecanismo de produção das lesões observadas.

Para quem escolhe a medicina legal, o Dr. Carlos destaca que é preciso ter a noção que é uma especialidade exigente, “que necessita de entrega, de amor e paixão para que possamos nos superar a cada perícia”. Assim, ele orienta que não deve pensar na área como um emprego, ou naquele lugar em que se vai buscar mais um salário. “Quem pensa assim acaba por ser infeliz, e se desiludir. Quem escolhe a medicina legal deve ter a noção de que será a sua entrega e dedicação que o levará a ser um bom perito. A perícia vale aquilo que vale o perito, mas antes disso, é preciso ser médico. Médico de gente, gostar do semelhante, tocar, examinar. Considero a residência médica fundamental para a diferenciação e a prática médica”.

Ele ainda se define como um apaixonado pela medicina legal, interesse que surgiu desde o seu primeiro ano da faculdade. “No segundo ano assisti no IML-AP no Rio de Janeiro a minha primeira autópsia, desde então nunca mais me afastei da área”, relembra o palestrante, que desde 2007 é perito médico do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses de Lisboa, Portugal, e mantém estreita relação com a medicina legal do Brasil. “Considero estes eventos uma troca de experiência muito enriquecedora para todos aqueles que participam”, frisa.

Projeto AMU

O AMU é um projeto de extensão da Unoeste em parceria com a Amlesp e ligas acadêmicas de outras 11 universidades, conforme explica a professora doutora Rita Higa, responsável pela disciplina de Medicina Legal e Perícias Médicas da Medicina Prudente. Na abertura da palestra on-line, a docente agradeceu ao Dr. Carlos por mais uma vez compartilhar seus conhecimentos com profissionais e estudantes de diferentes instituições, e destacou a participação do representante da Amlesp Dr. João Oba. Ela também ressaltou que o evento contabilizou mais de 400 inscritos, de vários lugares do Brasil.

A aluna do 5º termo da Medicina Unoeste e presidente da liga acadêmica na área, Fabiana Quelho Witzler Ribeiro, ressalta que Lamelt está empenhada em ampliar os conhecimentos da área, com palestras e aulas ministradas por profissionais experientes na carreira. “E o fato de estar sendo on-line contribui ainda mais para compartilhar esses momentos com o maior número de pessoas. Estamos tendo muitos inscritos e tivemos eventos com mais de 900 acessos”, relata a estudante, frisando que as palestras e aulas do projeto são gratuitas e os participantes inscritos recebem certificado. “É uma oportunidade enriquecedora, tanto no sentido técnico como de curiosidade mesmo, além da oportunidade de partilhar vivências e saber mais da área”.

Ligas Acadêmicas

Ao todo, são 12 ligas envolvidas no projeto: além da Unoeste, também integram as instituições de Santa Marcelina, São Leopoldo Mandic, Faculdade de Medicina de Marilia, Anhembi Morumbi, Unifae, Nove de Julho Osasco, Centro Universitário de Rio Preto, Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Santa Casa e Universidade Santo Amaro.

Redação

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