O Brasil caminha tristemente para a marca de 500 mil mortes por Covid-19. O número de casos avança e, não tardará, serão 16 milhões. Não é fora da curva calcular que, ainda em 2021, podemos somar 1.000.000 de óbitos em decorrência da pandemia. Estarrecedor, triste, chocante; faltam adjetivos para definir tamanha tragédia.
Lamentavelmente, colhemos agora erros recorrentes e históricos na condução das políticas sociais e econômicas do país, em particular no campo da saúde. Nosso SUS, sistema considerado dos mais perfeitos do mundo teoricamente, segue com problemas graves, desde a criação.
Um deles é a falta de acesso. Há ainda carência de recursos humanos, insuficiência de insumos/medicamentos, assim como a oferta de leitos, o subfinanciamento, além de casos (muitos casos) de gestão ineficaz e, por vezes, marcada por corrupção.
São os mesmos gargalos há décadas. Ocupam o noticiário diariamente, antes mesmo de 1988, quando a Constituição celebrou a saúde como direito universal de todo cidadão brasileiro, com equidade e integralidade, dando origem ao SUS.
O Sistema Único de Saúde nasceu a partir de mobilizações populares durante o processo de redemocratização do Brasil. Momento ímpar: então, convergiram para uma proposta comum, em prol do coletivo, pensamentos plurais, políticos de partidos distintos, entidades médicas como a Sociedade Brasileira de Clínica Médica e a Associação Médica Brasileira, instituições da sociedade civil, apenas para citar poucos exemplos. Em suma, prevaleceu a atitude cidadã em benefício da saúde como política de Estado, para o povo.
Pensar em algo do gênero atualmente é quase surreal. Predomina um acirramento de ânimos. O planeta está dividido; pior, nos sentimos em guerra). Uns são lado A, outros lado B. Uns se fecham no preto, outros no branco. Uns dizem verão, outros respondem inverno.
Por favor, muita calma nessa hora. Existem outras cores, o alfabeto possui dezenas de letras, temos mais estações em um ano.
Ação cidadã passa obrigatoriamente pela consciência do bem comum. Só seremos um país de fato gigante quando as necessidades básicas de todos estiverem equacionadas.
É mais do que hora de relevar diferenças menores, buscando ajustes e avanços de consenso.
Vale para a saúde, para a educação, para moradia, para tudo. Feliz foi o poeta em sua conceituação: “Gente é pra ser feliz, não pra morrer de fome”.
Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM)