Diante da crescente demanda pela importação de medicamentos à base de cannabis, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou uma resolução para acelerar o processo de acesso a esses remédios, simplificando o cadastro dos pacientes que precisam desses produtos.
A cada dia, estudos vêm comprovando a eficácia da cannabis medicinal para os mais variados tratamentos, como epilepsia, Parkinson, Alzheimer, esclerose múltipla, dor crônica, transtorno do espectro autista, transtorno de ansiedade, sintomas associados ao câncer, entre outros problemas de saúde. Em função dos exitosos resultados, nos últimos seis anos, os pedidos para importar medicamentos à base de cannabis tiveram alta de mais de 2.400%, passando de 896 solicitações, em 2015, para 19 mil em 2020. A marca foi superada no período de janeiro a setembro deste ano, quando a Anvisa recebeu 22 mil solicitações de importação.
A resolução da agência estabelece que a importação de produtos derivados de cannabis por pessoa física deve ser somente para uso próprio, com prescrição de um profissional médico legalmente habilitado e receita válida por seis meses. Apesar das evidências científicas e das discussões sobre a questão ganhando cada vez mais destaque, ainda são poucos os médicos que incluem a medicação nos tratamentos de seus pacientes.
“A Medicina – profissionais e instituições de ensino – precisam se engajar mais na questão, pois nós, médicos, temos a obrigação de sempre buscar para os nossos pacientes a melhor assistência disponível e incorporar a nossa prática médica, ferramentas terapêuticas comprovadamente seguras e eficazes, como é o caso da cannabis medicinal”, ressalta Patrícia Montagner, especialista em Neurocirurgia e fundadora da WeCann Academy, comunidade global e centro de estudos em Medicina Endocanabinoide.
Com as constantes repercussões acerca da eficácia dos medicamentos à base de cannabis em diversos tratamentos de saúde, pacientes têm buscado cada vez mais informações sobre os benefícios e, para esclarecimentos, a fonte mais segura é o médico. Por isso, Patrícia salienta a necessidade de formação dos profissionais sobre esse tipo de terapia, para o esclarecimento tecnicamente correto e a garantia de bem-estar dos pacientes. “Por conta do ambiente confuso e muitas discussões enviesadas, milhares de pessoas que já esgotaram as alternativas habituais de tratamento e que poderiam se beneficiar da cannabis medicinal permanecem desassistidas. Como médicos e defensores da saúde, não devemos continuar assistindo a isso passivamente, por isso, a capacitação, o entendimento e o aprofundamento sobre o tema são essenciais”, conclui.
Recentemente, foi aprovado o Projeto de Lei 399/15, por uma comissão especial da Câmara dos Deputados, para legalização do cultivo e produção da planta cannabis para fins medicinais no país. A especialista espera que, com as repercussões de estudos científicos e ações que facilitem o acesso aos medicamentos, como a executada pela Anvisa, essa proposta avance com mais celeridade. “Esse projeto, se aprovado, diminuirá o sofrimento de muitas famílias e garantirá a qualidade de vida a que todos merecem e têm direito”, conclui.
Mercado legal de cannabis medicinal e industrial é tema de encontro de especialistas no sábado, em São Paulo
No sábado (23)), das 9h às 19h, acontece em São Paulo (SP) a terceira edição do Cannabis Thinking, principal evento de negócios do mercado legal de cannabis da América Latina. Realizado anualmente pela The Green Hub, o encontro vai reunir mais de 60 experts sobre o tema, entre pesquisadores, profissionais da saúde, empresários, empreendedores, investidores, políticos e profissionais de outras áreas. Na pauta, os novos negócios e os avanços em torno do uso medicinal e industrial da cannabis e o panorama dessa área no Brasil e em países vizinhos.
Entre os participantes, nomes como os de Wilson Dib, ex-presidente da Anvisa; do neurocientista Sidarta Ribeiro; do cientista e empreendedor Fabrício Pamplona, do especialista internacional em cannabis e CEO da Regennabis, Patrick McCartan; do neurocientista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Stevens Rehen, entre outros experts no tema.
No encontro, haverá médicos de várias especialidades que receitam o uso de terapias à base de cannabis para tratamentos de casos de epilepsias, dores crônicas, Parkinson, autismo, entre outras moléstias. Destaque para o neurocirurgião e diretor médico do Centro de Excelência Canabinoide, Pedro Pierro, o neurologista Rubens Wajnsztejn; o neuropediatra Flávio Geraldes; a neuro-oncologista Paula Dall’Stella, o ortopedista Ricardo Tardini, entre outros especialistas.
Startups – O Cannabis Thinking recebe também representantes de farmacêuticas, além de empreendedores que já estão investindo nesse mercado que desponta no país. Representantes de várias startups vão mostrar os caminhos e oportunidades nessa nova área de negócios, caso da Adwa, startup, especializada no desenvolvimento genético de sementes de cannabis, que nasceu de iniciativa de estudantes da Universidade Federal de Viçosa (MG).
O mercado brasileiro de cannabis é visto com interesse em todo o mundo, e a presença estrangeira é uma marca do evento. No Cannabis Thinking deste ano, destaque para o presidente da Câmara de Cânhamo Industrial do Paraguai, Marcelo Demp, e o fundador e primeiro presidente da Câmara de Empresas de Cannabis Medicinal do Uruguai, Marco Argota. Eles mostrarão um pouco da experiência e dos negócios com cannabis em seus respectivos países.
Sebastian Marroquin, arquiteto e escritor colombiano, filho de Pablo Escobar, também será um dos palestrantes do evento. Ele vai contar sua perspectiva em relação à paz pelas drogas, antítese de seu pai, que foi um dos ícones da chamada guerra pelas drogas.
Negócios – “O Cannabis Thinking 2021 trará aos participantes uma rica experiência de conteúdo, debates e, claro, muitas oportunidades de negócios em todos os setores”, afirma Alex Lucena, sócio e CIO da The Green Hub. Segundo ele, se trata de uma ocasião única para o público conhecer e se aprofundar no universo de negócios que esta planta proporciona.
O CIVI-CO, polo de impacto cívico socioambiental, localizado no bairro de Pinheiros, em São Paulo, sedia a conferência. A realização é da The Green Hub, primeira consultoria e aceleradora brasileira com foco específico na indústria da Cannabis, com correalização do Centro de Excelência Canabinoide (CEC) e Instituto de Pesquisas Sociais e Econômicas da Cannabis (IPSEC).
Informações e inscrições: thegreenhub.com.br/cannabis-thinking/evento-2021
Livro “Drogas: o que sabemos sobre?” desafia conceitos e preconceitos
‘Drogas: o que sabemos sobre?’, da editora Appris) de Bruno Garcia Simões Favaretto, mestre em Neurociências e Comportamento, e Poliana Guerino Marson, doutora em Biotecnologia, desafia conceitos e preconceitos, traz reflexões profundas sobre o tema e seu impacto na proibição e legalização. O livro se destaca na abordagem das mais diversas substâncias e suas diferenças, com informações atuais e contextualizadas. Em 437 páginas, a obra conta com participação de outros autores especialistas e surpreende ao apresentar as drogas de forma multidisciplinar, com seus aspectos históricos, socioeconômicos, legais, políticos, químicos, farmacológicos e biomédicos.
O livro inova também com informações farmacológicas de como as drogas são absorvidas, processadas, eliminadas, atuam no sistema nervoso e, consequentemente, no comportamento humano. Com ilustrações explicativas, inclusive algumas de autoria do próprio autor, que é também ilustrador científico, o livro contém raridades como a primeira ilustração científica da espécie Banisteriopsis caapi (popularmente conhecida como Cipó-Mariri), uma das plantas cruciais na preparação do Ayahuasca.
Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (USP), Bruno Favaretto conta que o livro propõe uma nova perspectiva neurológica sobre a dependência de substâncias. “Mostramos como as drogas atuam em nosso corpo de forma integrada entre medicina, psicologia e evolução. O livro é atualizado com descobertas mais recentes, trazendo, por exemplo, releitura de quais receptores neurais cada droga atua e, consequentemente, como podem ser explicados os efeitos das drogas”, completa o autor.
A questão do uso medicinal de drogas e sua regulamentação é abordada no terceiro capítulo do livro pelo advogado Leonardo Lima, integrante da Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas (Rede Reforma). Bruno Favaretto considera que esse assunto no Brasil é tratado de forma muitas vezes incoerente e irresponsável, apesar dos esforços que vêm sendo feitos para mudar o atual cenário. “Se o argumento é proibir para preservar a saúde pública, que seja proibido o acesso a todas as substâncias claramente danosas (incluindo álcool e nicotina). Mas isso não é feito por questões político-econômicas”, diz o autor.
Ele lembra que a proibição desmotiva a pesquisa sobre a aplicação medicinal e científica de substâncias como a maconha, o LSD e o Ecstasy, que têm propriedades terapêuticas com eficácia comprovada ou resultados promissores. “Muitos pacientes que poderiam ser beneficiados pelo uso terapêutico de drogas, dispensam suas últimas energias em processos judiciais, burocraticamente justificados pela pura ilegalidade da substância”, lamenta.
Autores
Bruno Favaretto é Mestre em Neurociências e Comportamento e graduado em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (USP). Discente do Curso de Medicina da Universidade Federal do Tocantins (UFT), onde atuou como professor convidado. Exerceu atividades de ensino, pesquisa e extensão em Anatomia Humana. Trabalhou com pesquisas no campo de Qualidade de Vida e Saúde, Neurologia, Comportamento Animal, Sistemática Vegetal e Processos de Ensino-Aprendizagem. Ilustrador Científico.
Poliana Marson é Doutora em Biotecnologia pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), mestre em Ciências – Bioquímica e graduada em Farmácia-Bioquímica pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Docente adjunto do curso de graduação em Medicina da UFT. Atualmente participa como docente permanente e vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação de Mestrado em Ciências da Saúde da UFT. Tem experiência na área Farmacêutica, com ênfase em Farmacologia e Análises Clínicas.