Aqueles que acompanham a prestação de serviços médicos e respectiva responsabilização por processos de erro médico, sempre observaram o mercado norte americano, referência no alto índice de judicialização do seguimento.
A pergunta sempre foi: Em algum momento, o Brasil irá superar a quantidade de processos de erro médico dos USA?
Infelizmente, a resposta é positiva. Chegou tal momento.
Apenas como referência, segundo compilação de dados do CNJ, a BBC News Brasil, em reportagem afirmou a existência de 70 novos processos relacionado a matéria de erro médico por dia, ou 3 processos novos por hora, no ano de 2017.
Atualmente, 7% dos médicos do Brasil, respondem algum tipo de processo, contra 5% nos USA.
Há 15 anos, 1 a cada 20 médicos era processado, hoje 1 a cada 5 médicos são processados.
Tal crescimento, infelizmente está associado e é impulsionado fundamentalmente pelos elementos abaixo:
– Os “sites” indicando falhas hospitalares de forma recorrente e as matérias jornalísticas repisando erros e má conduta médica, acabam impulsionando uma predisposição de processar médicos, solidificando, por exemplo, a impressão de que falhas na prestação de serviços médicos representam a 3ª maior causa de morte no Brasil;
– A proliferação e crescimento de associações de proteção a pacientes vítimas de erro médico e de grupos em redes sociais no mesmo sentido, dotada de forte estrutura jurídica, fomenta grande número de ações judiciais em muitas situações, com exclusivo objetivo de captação de clientes num mercado altamente rentável;
– O desequilíbrio legal trazido na relação da prestação de serviço médico, pelo Código de Defesa do Consumidor, que autoriza o paciente propor ação sem necessidade de provar nada, em condição de hipossuficiência, e com presunção de culpa, pela aplicação da responsabilidade civil objetiva, nas hipóteses de ações contra empresas médicas, sem contar que o paciente não tem qualquer ônus, na hipótese de gratuidade de justiça, proporciona uma verdadeira loteria, onde o paciente não tem nada a perder;
– A precariedade das condições de trabalho de médicos, que por vezes tem deficiência de estrutura, de pessoal, de recursos e grande demanda, coloca o profissional médico em grande exposição;
– A mudança do acesso à informação médica, antes segregada nas escolas médicas, e atualmente acessível na internet, gerou alteração do perfil do paciente, que passou a ser mais instruído, questionador, exigente e pouco tolerante;
– A majoração de atendimentos em tempos cada vez menores, ensejando consultas “a jato” e o consequente enfraquecimento da relação médico paciente provoca a majoração das incidências de erro técnico profissional;
– A redução de critérios de seleção por parte dos médicos em relação aos procedimentos indicados, por necessidades financeiras;
– A ausência de comprometimento e/ou tolerância de pacientes que não são egressos de relacionamento ou indicação pessoal, mas de relação impessoal por vezes oriunda de mera referência na rede credenciada de operadoras de planos de saúde;
– A existência de aplicativos médicos como de controle de pontualidade de consultas, avaliação de qualificação técnica, assistência a distância e outros, que expõe gravemente médicos a possibilidade de responder por infrações;
– A exposição indevida de médicos, que por vezes se colocam na condição de youtubers e blogueiros de grupos eletrônicos, com o objetivo de promover seus consultórios;
– Aceitação por parte do Judiciário de valores altíssimos de pedidos de indenização.
Infelizmente tais elementos atualmente ensejam a condenação em média de 30% dos médicos que são processados, distribuídos em processos cíveis, criminais e/ou éticos profissionais.
É preciso que a classe médica reflita sobre as causas ora indicadas – internas e externas – que contribuem sobremaneira com o assustador crescimento de ações judiciais contra médicos e empresas médicas, sendo imperioso, a aplicação de esforços visando a redução de tais índices.
Fernando Bianchi é especialista em Direito Médico, sócio do Miglioli e Bianchi Advogados