Atualmente, não há mais dúvida de que a responsabilidade civil do médico pelos atos que pratica no exercício de sua atividade profissional decorre de sua relação contratual estabelecida com o cliente, sendo certo que a inexistência de documento escrito que a instrumentalize não desnatura e não descaracteriza essa relação contratual.
A obrigação jurídica do médico é a de tratar o paciente com zelo e todos os cuidados dentre as práticas recomendadas. Assim, assume “obrigação de meio”, compreendendo-se, porém, a possibilidade de responsabilizá-lo civilmente por culpa se houver negligência, imprudência ou imperícia (art. 951, Código Civil). A aferição de culpa depende de prova técnica (prova pericial) para delimitar sua responsabilidade, e a insuficiência dela implicará no afastamento de culpa e de qualquer reparação.¹
Há situações em que a obrigação não é de meio, mas de resultado, como naquelas em que o paciente contrata serviços estéticos esperando resultados que melhorem sua aparência e traga conforto pessoal. Assim, o médico deverá cumprir aquilo a que se obrigou, e qualquer resultado diverso do esperado caracterizará descumprimento contratual.
Tais procedimentos estéticos visam corrigir aspectos anatômicos e melhorar a autoestima do paciente. Contudo, há casos em que se não alcançado o resultado, poderá inexistir consequência, como, por exemplo, na cirurgia em indivíduos com lesões por queimaduras, condição que nem sempre permite restaurar o estado anterior à lesão, sobretudo, porque há reações decorrentes do próprio organismo que não podem ser previamente conhecidas.
Nesse sentido, é a decisão proferida em julgamento realizado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo que afastou a indenização reclamada por paciente que não demonstrou nexo de causalidade entre a conduta e o dano alegado.²
A indenização, quando a culpa é comprovada, inclui o dano material e o dano moral, não precisando este ser provado, decorrendo como consequência lógica do fato.
A responsabilidade do anestesista tem significativa importância antes, durante e no pós-operatório, devendo ser diligente no trato do paciente, inquirindo dele o quão necessário para obter as informações para indicar o tratamento, devendo também prestar as informações necessárias sobre o procedimento (art. 14, Lei 8.078/90).
Muito embora não haja dificuldade em estabelecer sua responsabilidade no momento anterior e posterior à cirurgia, a dúvida surge quando ele está na sala ao lado de outros profissionais com múltiplas especialidades. Neste caso, a questão é saber se há, ou não, responsabilidade solidária do médico chefe por erro cometido exclusivamente pelo anestesista.
O STJ pacificou entendimento de que não há responsabilidade objetiva atribuída ao médico chefe, pois ainda que o anestesista atue em conjunto na sala, a sua atuação é autônoma, razão pela qual não há solidariedade entre ele e o cirurgião chefe, salvo comprovada culpa deste.³
Assim, a responsabilidade civil do médico é subjetiva e depende da prova do fato e da aferição de culpa, demonstrando a ocorrência de negligência, imprudência ou imperícia em sua atuação.
Bibliografia:
Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade Civil, Vol. 4, Direito Civil Brasileiro, p.285-286.
Aguiar Dias, Da Responsabilidade Civil, Vol. I, p.261.
Teresa Ancona Lopes, Responsabilidade Civil, p. 316-318.
Referências:
¹TJSP, Apelação nº 1034382-83.2016.8.26.0602, 11ª Câmara D. Privado, des. Marcelo L. Theodósio, DOE, p. 23.02.2022.
²TJSP, Apelação nº 9000079-46.2009.8.26.0053, 9ª Câmara D. Privado, rel. Des. Rebouças de Carvalho, DOE, p. em 13.05.2015.
³STJ, EResp nº 605.435-RJ. 2ª Secção, rel. Min. Nancy Andrighi, Dje p. 28.11.2011.
Tadeu Ragot é advogado militante, graduado e pós-graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor universitário. Sócio responsável pela área Cível do escritório RSZM Advogados