Na metade de junho, o mundo presenciou ao vivo, pela televisão, como uma parada cardiorrespiratória (chamada de morte súbita) geralmente ocorre: sem avisos. O jogador dinamarquês Christian Eriksen, 29 anos, estava jogando, em uma partida da seleção de seu país contra a Finlândia, quando, de repente, caiu de forma súbita, com o coração parado. Poucos dias antes, no Brasil, o jovem ator Rafael Cardoso, 35 anos, passava por uma cirurgia para o implante de um desfibrilador cardíaco, após descobrir o risco de morte súbita.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac), algum descompasso no coração acomete mais de 20 milhões de pessoas no país, sendo responsável por mais de 320 mil mortes súbitas, todos os anos. Em outras palavras, quer dizer que um a cada dez brasileiros sofre de algum tipo de arritmia.
Voltando ao caso do jogador: por que Eriksen não foi mais um número dessa fatídica estatística? Porque, quanto mais rápido o atendimento, maior a chance de sobrevivência. A cada minuto perdido, a chance de sobreviver diminui de 7% a 10%. No caso do jogador, um rápido atendimento médico, com imediato uso de um desfibrilador automático (DEA), salvou a sua vida. Fora de um ambiente controlado, como uma partida de futebol, é necessário treinar a população para reconhecer uma parada cardíaca e prestar atendimento inicial, com a massagem cardíaca e a disponibilidade obrigatória de um DEA em lugares de grande circulação, como shoppings centers, escolas e mercados. Isso poderá salvar muitas vidas – e, quem sabe, a de um familiar próximo a você. DEA, numa explicação simples, é um aparelho que dá choques, interrompendo a arritmia mortal, de fácil manejo, para ser usado por qualquer cidadão.
O distúrbio pode ocorrer em homens ou mulheres, de qualquer idade, e pode ser causado por uma falha na atividade elétrica cardíaca, associado ou não à presença de doença estrutural do coração. Alguns casos estão associados a fatores de risco, como obesidade, colesterol alto, pressão elevada e sedentarismo, mas especialmente tem origem hereditária.
Nesse contexto, entra a história do ator Rafael Cardoso, previamente saudável, e que foi submetido a implante de um cardiodesfibrilador (poderíamos chamar de um modelo de DEA no interior do seu peito) de forma antecipada a qualquer episódio de desmaio, pois foi identificada uma cardiopatia de risco aumentado para morte súbita. Aqui está outra verdade na redução da trágica estatística de morte súbita: a prevenção cardiovascular, com a identificação de forma precoce de formas de doenças com predisposição a essa situação, principalmente em famílias que já foram atingidas por uma ocorrência assim.
É difícil falar sobre morte súbita, principalmente de jovens. O problema é que, ao esquecer de sua existência, esquecemos também como preveni-la, reconhecê-la e tratá-la. Por essa razão, cada vez mais pesquisas, campanhas, disponibilização dos DEAs e divulgações são feitas para chamar atenção e buscar soluções que nos permitam tranquilizar e salvar vidas dos cidadãos.
Rafael Ronsoni é PhD em Cardiologia, médico do corpo clínico do Hospital Dona Helena, de Joinville (SC)