Interessante que, até há alguns anos, ficávamos surpresos e atônitos quando notávamos que pessoas alcançavam seus 80 a 90 anos ou mais. Hoje, a previsão é de que nas próximas décadas nos surpreenderemos cada vez menos com idosos, em maior número, que chegaram acima dessa faixa etária ou até 100 anos. Isso porque, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e da Organização das Nações Unidas, a previsão da expectativa de vida em países em desenvolvimento, como o Brasil, só cresce.
Em 2040, a expectativa de vida média do brasileiro será de 76,9 anos para homens e de 83,4 anos para as mulheres. Mais do que isso, a perspectiva é a de que quase 30% da população será de pessoas idosas, refletindo um envelhecimento populacional que vem ocorrendo de forma exponencial nas últimas décadas. Pelo que estamos observando, a tendência é de que aconteça com mais velocidade ainda nos próximos anos.
De acordo ainda com a ONU, o mundo tem 1,1 bilhão de idosos espalhados em países com pessoas acima dos 60 anos, como China (264,7 milhões), Índia (148,7 milhões), EUA (79,3 milhões), Japão (44,4 milhões), Rússia (32,9 milhões), Brasil em 6º lugar com 31,5 milhões, Indonésia (29,9 milhões), Paquistão (15,9 milhões), Bangladesh (15,8 milhões), México (15,5 milhões), Nigéria (10,4 milhões) e Etiópia (6,1 milhões de idosos).
Em 2050, a previsão global de idosos deve alcançar 2,1 bilhões de pessoas com 60 anos e mais de idade. Esses dados nos levam a diversas reflexões. Sabemos que o envelhecimento pode vir acompanhado pelo aparecimento de algumas doenças e diversas perdas: a de emprego, de entes queridos, da vitalidade.
Na prática, pela experiência clínica, vemos que o maior medo é decorrente da perda de independência e autonomia. Este aparece à frente do medo da morte em si. Tornar-se incapaz, dependente da ajuda de outras pessoas, dependente de cuidados de uma cama. Mas, será que sempre que falamos em envelhecer, estamos falando de doença? E o que podemos fazer para que essa independência que tanto prezamos não seja perdida?
Recentemente, houve uma discussão após a OMS ter incluído o termo “velhice” na nova classificação internacional de doenças – o CID11 – reduzindo um processo natural a uma condição de doença. Após diversas discussões entre os órgãos responsáveis, a comunidade científica obteve êxito em substituir esse termo por “declínio da capacidade intrínseca relacionada ao envelhecimento”.
Nada mais é do que, a interação das capacidades físicas e mentais do indivíduo, e suas interações com o ambiente em que vive. Porém, ainda assim, é difícil definir o envelhecimento. Sabemos que se trata de um processo natural e complexo resultante de diversos fatores tanto biológicos quanto socioambientais. Sendo assim, o objetivo da maioria das pessoas e profissionais que atuam com o envelhecimento é sempre a de que, o indivíduo atinja a terceira idade com manutenção de sua autonomia e independência, mantendo-se ativo na sociedade.
Além disso, com a saúde bem controlada, é possível sim desfrutar e ter qualidade de vida e aproveitá-la como quiser. E aí temos uma outra reflexão: nossa sociedade busca cada vez mais por soluções fáceis e simples para processos complexos. A busca pela “pílula da longevidade” não ficaria fora disso. Afinal, não seria muito mais fácil se tivéssemos uma solução única, ou, às vezes, em forma de inúmeros comprimidos, suplementos, polivitamínicos, ou até, como está na moda atualmente, “soro de vitaminas injetáveis”?
Não tem mágica para alcançar a longevidade ideal
Bom, se alguém promete essa solução, desconfie. O raciocínio é fácil: como pode haver uma solução simples para um processo extremamente complexo que sofre diversas influências ao longo de uma biografia inteira? Essa “pílula mágica da longevidade não existe”, mas há um caminho para que esse processo se desenvolva da melhor maneira possível. A má notícia é que isso exige esforço pessoal, e, mais importante, que comece o quanto antes.
Realizar atividade física de forma regular, manter alimentação saudável evitando consumo de ultra processados, álcool em excesso e tabagismo, manter-se ativo em grupos sociais e trabalho, procurar aprender coisas novas em qualquer fase da vida. Por exemplo: tocar um novo instrumento, aprender uma nova habilidade artística, aprender um novo idioma e procurar ressignificar as perdas que o envelhecimento trás com oportunidades que se escondem em novos ganhos.
Algumas condições podem acelerar esse envelhecimento precoce como falta de uma boa alimentação, redução e privação do sono ou de má qualidade, isolamento, estresse, sedentarismo, tabagismo e outros hábitos que vão sendo cultivados na rotina e não são percebidos. Agora que já sabemos que daqui alguns anos a maioria de nós atingirá idades maiores que 80 ou 90 anos, vamos começar o quanto antes a promover nosso próprio envelhecimento bem-sucedido e saudável. É um caminho possível, e toda hora é hora de recomeçar.
Dra. Patricia Puccetti é coordenadora da Pós-Graduação em Geriatria e de Clínica Médica da Escola Brasileira de Medicina (EBRAMED). É especializada em geriatria pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia