A Telemedicina como meio de ampliar o acesso universal e integral à saúde, expressa em políticas públicas legitimadas, integra o mínimo existencial de cada cidadão brasileiro. É, portanto, um direito de todos e dever do estado, e deve ser garantida mediante políticas sociais e econômicas vigentes no país. O notável avanço das tecnologias da informação e comunicação, e sua aplicação na saúde, deve ser foco constante da atenção do poder público, sendo um instrumento de equidade e fomento à dignidade da pessoa humana.
Essa tecnologia pode ser conceituada como forma organizada e eficiente de exercício da Medicina a distância para fins de informação, diagnóstico e tratamento de indivíduos, isoladamente ou em grupo, baseada em dados, documentos ou outras informações confiáveis transmitidas por intermédio de telecomunicações. Atualmente, o emprego da Telemedicina tem abrangência crescente, sendo possível realizar desde consultas (teleconsulta), diagnósticos (telediagnóstico) até complexas cirurgias robóticas (telecirurgia). Todo esse avanço deve ocorrer centrado no melhor interesse do paciente.
As doenças cardiovasculares são responsáveis por mais de 30% da mortalidade global, inclusive no Brasil, e esse contexto será agravado com o envelhecimento e o adoecimento da população. Não há como desconhecer que os recursos para ofertar a ampliação da assistência à saúde, especialmente para a crescente prevalência das moléstias cardiovasculares, sobretudo em áreas remotas de um país como o Brasil, é uma missão complexa. Será um desafio, a ser superado, levar profissionais de saúde aos mais longínquos rincões.
Cerca de 65% dos municípios brasileiros estão situados em áreas remotas e localizam-se nas regiões Norte e Centro-Oeste. Por outro lado, o estudo Demografia Médica no Brasil, de 2018, relatou significativa desigualdade na distribuição dos médicos, que predominam nos grandes aglomerados urbanos das regiões Sul e Sudeste, onde se encontra também o maior número de especialistas, com menor densidade médico/habitante nas regiões Norte e Nordeste. A Telemedicina, se aplicada em seu contexto amplo, poderia permitir o acesso e a equidade, ofertando serviços de qualidade com suposta custo-efetividade.
Os benefícios dessa tecnologia poderiam ser, igualmente, aplicáveis à saúde suplementar, mesmo diante de marco regulatório diverso, e da cobertura assistencial presencial adequada. Cabe ressaltar que a maior parte dos beneficiários da saúde suplementar reside em centros maiores, onde a relação médicos/especialistas por habitante é apropriada, e as consultas presenciais, uma imposição legal.
Recomenda-se que sejam mantidas, nos procedimentos de Telemedicina e Telecardiologia, as bases estabelecidas pelo Código de Ética Médica. A Telemedicina deve ser considerada uma ferramenta adicional para a relação médico-paciente presencial, sem jamais substituí-la. É uma ferramenta importante para assegurar a universalidade e integralidade do sistema de saúde e tem que ser implementada com embasamento técnico, ao seu tempo, e de forma bastante precisa e equilibrada.
Marcelo Queiroga é presidente eleito da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Gláucia Maria Moraes de Oliveira é editora associada da revista ABC Cardiol e Luciano Mariz Maia, vice-procurador-geral da República