Novo estudo sugere desequilíbrio neuroinflamatório em pacientes com esquizofrenia

Caracterizada por diversos sintomas comportamentais e cognitivos, a esquizofrenia é um transtorno mental que afeta cerca de 0,5 a 1% da população mundial. Os mecanismos envolvidos no surgimento da doença ainda não estão esclarecidos, mas deficiências no desenvolvimento neurológico, alterações no sistema de neurotransmissão e disfunções imunológicas são quadros relacionados ao diagnóstico. Com o objetivo de investigar mais a fundo essas respostas imunológicas em células cerebrais de pacientes com esquizofrenia, um novo estudo foi recém-publicado na revista científica Molecular Psychiatry.

Desenvolvida por pesquisadores do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL/MG), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Instituto Nacional de Biomarcadores em Neuropsiquiatria (INBION) e a Universidad de Chile, a pesquisa examinou as respostas inflamatórias dos astrócitos derivados de células-tronco de pluripotência induzida humanas (hIPSC) de pacientes com esquizofrenia. Os astrócitos são o tipo celular responsável pela manutenção do sistema nervoso central, uma vez que regulam a comunicação entre neurônios e o metabolismo energético, além de serem uma importante fonte de citocinas (moléculas) inflamatórias.

No estudo foram usadas amostras de sete indivíduos: três diagnosticados com esquizofrenia e quatro saudáveis. Essas amostras foram obtidas de forma não-invasiva a partir da pele ou de células presentes na urina dos voluntários. Esse material passou por um processo de reprogramação genética, sendo convertido em células-tronco pluripotentes, que depois foram transformadas em astrócitos humanos com o código genético de cada um de um de seus doadores.

Stevens Rehen, neurocientista e pesquisador do IDOR, explica um pouco mais: “A análise revelou 68 proteínas desreguladas nos astrócitos das pessoas com esquizofrenia, incluindo proteínas envolvidas com a estrutura celular e atividade metabólica. Outras proteínas relacionadas a processos imunológicos se apresentaram hiper-reguladas, como os receptores de apresentação de antígenos, caracterizados pela ativação da resposta imunológica. Uma análise mais detalhada revelou outros marcadores relacionados à inflamação, incluindo a S100β (proteína encontrada principalmente nos astrócitos em doenças neurológicas) e o fator de transcrição NF-κB (complexo de proteínas que atua na resposta celular frente à agressão como infecções e inflamação).

E complementa: “O estudo também demonstrou que após estimulação, os astrócitos derivados dos pacientes com esquizofrenia tiveram a ativação de NF-κB p65 reduzida em cerca de 50% em comparação ao grupo controle. Mais de 60 proteínas se mostraram reguladas de forma diferencial entre os grupos, e estas exerciam funções biológicas como inibição da morte celular, ativação do crescimento de vasos sanguíneos e também pró-inflamação, principalmente a interleucina-8 (IL-8). Ao constatar a presença de IL-8, molécula associada ao recrutamento de células inflamatórias e a ativação de vasos sanguíneos, os pesquisadores utilizaram uma proteína recombinante (proteína produzida em laboratório para avaliar a função proteica) de IL-8 no grupo controle. O resultado demonstrou o surgimento de vasos sanguíneos semelhantes ao grupo esquizofrenia, sugerindo que o IL-8 pode ser um importante regulador do calibre de vasos sanguíneos na esquizofrenia.”

Para os pesquisadores, os achados do estudo sugerem um desequilíbrio neuroinflamatório que afeta o cérebro. Apesar de uma amostragem pequena, o comportamento dos astrócitos nos três pacientes foi semelhante e o entendimento das interações entre as células do sistema imune e os astrócitos podem revelar potenciais alvos terapêuticos.

Em julho, em um outro artigo científico, também publicado na revista Molecular Psychiatry, pesquisadores do IDOR e da Universidade do Chile já haviam demonstrado que alterações funcionais de neurônios podem prejudicar o correto funcionamento dos vasos sanguíneos cerebrais com impacto sinérgico no funcionamento do cérebro. Esses cientistas descobriram – utilizando células-tronco reprogramadas – prejuízos na barreira hematoencefálica causados por alterações de expressão gênica em células endoteliais cerebrais – aquelas que compõem os vasos sanguíneos do cérebro e são responsáveis por nutrir as células neurais – derivadas de pacientes com esquizofrenia.

Redação

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