De acordo com a Organização Pan-americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso racional de medicamentos consiste em orientar um indivíduo sobre qual é o remédio apropriado para as suas necessidades, na dosagem certa, e de forma adequada ao quadro.
Recentemente, o dia do ‘Uso Racional de Medicamentos’ foi celebrado, tendo sido um tema amplamente discutido na mídia, o que é extremamente relevante e positivo para a informação de todos. Entretanto, é necessário entender a diferença entre as informações que se referem à automedicação e aquelas que se referem à autoprescrição, detalhe que quase sempre tem sido ignorado, levando a uma divulgação de maneira equivocada.
A confusão nas nomenclaturas se dá pela falta de entendimento entre as categorias de medicamentos de acordo com os critérios de venda. Por exemplo, os MIPs (medicamentos isentos de prescrição médica), pela sua ampla segurança reconhecida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), podem ser vendidos sem receita e por isso estão disponíveis em autosserviços de farmácias e drogarias. Esses medicamentos não possuem tarja que indiquem uma restrição de venda. Já os medicamentos com tarja vermelha ou preta, só podem ser vendidos com a apresentação de uma prescrição médica. Por isso, quando uma pessoa compra e utiliza um medicamento tarjado, por conta própria, sem a apresentação de uma receita, a melhor definição desta prática (incorreta) não seria automedicação, mas sim autoprescrição.
Um dos principais pilares da ACESSA (Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde) refere-se à educação do consumidor a respeito do uso correto e seguro dos MIPs. Por isso, a Entidade tem como uma de suas missões destacar que o uso desses medicamentos é rodeado por mitos que, muitas vezes, acabam sendo divulgados de maneira errada. É comum publicações que relacionam os números de intoxicações, o uso de MIPs (automedicação) e o uso de medicamentos de prescrição, por conta própria (autoprescrição), sem nenhum tipo de diferenciação.
A Entidade reconhece a importância dos dados de intoxicação divulgados pelos centros especializados, como uma importante ferramenta para a definição de estratégias eficazes de vigilância sanitária para fortalecimento do uso racional dos medicamentos, em especial dos MIPs. “E é justamente por isso que é preciso que os dados divulgados tenham um tratamento adequado, para que se tenha clareza, por exemplo, se a relação intoxicação/automedicação está relacionada ao uso de um MIP ou ao uso de um medicamento tarjado de venda sob prescrição, por conta própria. Automedicação refere-se ao uso de MIPs. Autoprescrição, não.”, comenta Marli Martins Sileci, vice-presidente executiva da ACESSA.
E a automedicação com o uso de MIPs pode ser estimulada justamente porque essa categoria de medicamentos possui legislação robusta a respeito.
No Brasil, a Anvisa é o órgão brasileiro responsável pela avaliação dos MIPs. Para serem classificados nesta categoria, esses medicamentos passam por uma qualificada e rigorosa análise. Neste processo são avaliados alguns critérios previstos na legislação vigente, que tornam ou não o medicamento elegível para ser considerado um MIP. Para permitir maior clareza e facilidade na consulta para toda a população, a Anvisa disponibiliza uma lista com todos os MIPs comercializados no Brasil, conhecida como LMIP. Os sete critérios iniciais definidos pela Agência Reguladora são: tempo de comercialização; perfil de segurança; indicação para tratamento de sintomas de doenças não graves e facilmente identificáveis; indicação de uso por curto período de tempo; ser manejável pelo paciente; apresentar baixo potencial de risco em situações de mau uso ou abuso; não apresentar dependência.
O uso racional de MIPs e a sustentabilidade do sistema de saúde
Além disso, o uso racional dos MIPs pode ser visto como um importante aliado ao sistema de saúde.
Um estudo intitulado ‘Utilização de medicamentos isentos de prescrição e economia gerada para os sistemas de saúde’, realizado pela Fundação Instituto de Administração (FIA) e publicado em 2017, mostrou que o uso de MIPs gera uma economia anual de R$ 364 milhões para o Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo o levantamento, para cada R$ 1,00 investido no consumo de MIPs, há uma economia para o setor público de saúde de até R$ 7,00.
Isso porque se reduz as faltas ao trabalho (absenteísmo), idas desnecessárias aos consultórios médicos e aos serviços de pronto atendimento e ainda a realização de exames de diagnósticos para questões simples de saúde. Infelizmente, ainda observamos prontos-socorros lotados com situações que deveriam ser tratadas de outras formas, preservando aquele espaço para casos efetivamente graves que requerem supervisão médica, obrigatoriamente.
Em um contexto de frequente pressão e déficit de recursos do sistema de saúde brasileiro, a disponibilização de MIPs reduz a necessidade de os cidadãos irem a um serviço de saúde para tratar de um sinal ou sintoma já conhecido de uma doença não grave. “Isso não quer dizer que os MIPs possam ser utilizados indiscriminadamente, muito pelo contrário, é preciso que o consumidor utilize um MIP, em seus primeiros sintomas, observando sempre as instruções de bula e rotulagem e, em caso de dúvidas ou se os sintomas persistirem, procure a orientação de um profissional da saúde”, enfatiza Marli.