Um estudo do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) demonstrou que os interferons tipo 1, glicoproteínas produzidas por células do sistema imune, atuam no combate à infecção por fungos do gênero Candida. Os interferons tipo 1 são conhecidos por sua atividade antiviral, sendo essenciais para combater o Coronavírus, por exemplo. Esse novo mecanismo descoberto pelos pesquisadores pode ajudar, futuramente, no desenvolvimento de terapias complementares contra os fungos, muitas vezes resistentes aos tratamentos convencionais. Publicado em versão pré-print, que aguarda revisão por pares, o trabalho foi desenvolvido pelo mestrando Ranieri Salgado, sob a orientação do pesquisador Otávio Marques.
O grupo analisou dados de transcriptomas disponíveis na literatura para investigar a atividade das diferentes camadas do sistema imune na resposta às infecções fúngicas. Somado a outros receptores e citocinas, em especial os receptores do tipo Toll, os interferons tipo 1 potencializam a resposta imune como um todo, aumentando as chances de recuperação do indivíduo. Foram analisadas as respostas ao Candida albicans, fungo oportunista presente no organismo que se aproveita de pessoas imunodeficientes, e ao Candida auris, fungo emergente e super-resistente, cujo primeiro caso no Brasil foi descoberto em dezembro de 2020. A infecção por esse fungo é mais comum em pessoas hospitalizadas.
“O trabalho indica que o nosso sistema imune utiliza as mesmas vias de sinalização para combater fungos e vírus. Se um paciente com Covid-19 é infectado por um fungo no ambiente hospitalar, por exemplo, sua recuperação pode ser prejudicada, pois a via de resposta já está sobrecarregada”, explica Marques. A hipótese dos cientistas é que o interferon tipo 1 pode ser uma importante estratégia terapêutica neste contexto. “O tratamento com interferons poderia corrigir a saturação dessa via, auxiliando o sistema imune do paciente a eliminar o fungo”, completa Salgado. Medicamentos com interferon já são usados para tratar imunodeficiências, hepatite C e esclerose múltipla, e têm sido estudados contra a Covid-19.
Nos próximos passos do estudo, os pesquisadores buscam entender a relação entre as infecções fúngicas e a Covid-19. “Pretendemos comparar as condições da resposta imune à Covid-19 e à infecção por Candida albicans, para confirmar se realmente os pacientes com SARS-CoV-2 teriam uma deficiência na resposta aos fungos, como alguns estudos têm indicado”, afirma Ranieri Salgado. Também está nos planos do grupo testar o tratamento de infecções fúngicas com interferons tipo 1 em animais.