SBH questiona planejamento do Ministério da Saúde para aquisição de medicamentos para hanseníase

A Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH) denunciou dias atrás a falta de medicamentos para os pacientes de hanseníase no Brasil e oficiou o Ministério da Saúde solicitando providencias e explicações. A doença coloca o Brasil em segundo lugar no ranking de países com mais casos (atrás da Índia), o tratamento é gratuito no país e a PQT (poliquimioterapia) medicação para tratamento da hanseníase é doada pela Organização Mundial de saúde (OMS). Além disso, a produção dos medicamentos não foi interrompida durante a pandemia atual.

“Não há razão para este desabastecimento, por isso, nossa preocupação recai sobre a atuação do Ministério da Saúde para planejar a importação e distribuição de medicação no país”, diz o presidente da SBH, dermatologista e hansenólogo Claudio Salgado, doutor em Imunologia da Pele pela Universidade de Tóquio.

A Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo informa que tem recebido estoques de medicamentos para hanseníase abaixo da necessidade desde março e o vice-presidente da SBH, Marco Andrey Cipriani Frade, docente da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP e coordenador do Centro de Referência Nacional em Dermatologia Sanitária com Ênfase em Hanseníase (no HC de Ribeirão Preto-SP), diz que a medicação pode faltar para o paciente a partir de setembro.

A SBH alerta em ofício encaminhado ao Ministério da Saúde que “a falta de tratamento aos pacientes de hanseníase pode acarretar problemas gravíssimos ao paciente e à sociedade em geral. Individualmente, o paciente não tratado fatalmente evoluirá com a história natural da doença para a incapacidade física, maior mantenedora de estigma e preconceito na sociedade, que será também coletivamente afetada pela transmissão do bacilo mantida pelos pacientes sem tratamento, bem como por todos os custos, emocionais, sociais e financeiros advindos da falta da PQT e das possíveis medicações substitutivas utilizadas para o tratamento da hanseníase. Adicionalmente, e tão grave quanto, existe a possibilidade do surgimento de cepas resistentes aos antibióticos tradicionais, que se juntariam às cepas resistentes já circulando no Brasil, potencializando significativamente o problema para a sociedade brasileira. Reiteramos que, caso se opte pela disponibilização dos medicamentos substitutivos, estes devem ser garantidos aos pacientes durante todo o tempo de tratamento”. O ofício da SBH pode ser acessado neste link www.sbhansenologia.org.br/noticia/oficio-da-sbh-ao-ministerio-da-saude-sobre-falta-de-medicamentos-para-tratamento-da-hanseniase.

O Ministério da Saúde, por meio da Coordenação-Geral de Vigilância das Doenças em Eliminação (CGDE) respondeu ao presidente da SBH, porém a sociedade médica alerta inconsistências nas argumentações do governo federal. O ofício do Ministério pode ser acessado na íntegra neste link www.sbhansenologia.org.br/upload/files/Of__cio_17_agosto.pdf.

Segundo o Ministério, a PQT é solicitada anualmente à OMS e distribuída trimestralmente aos estados e que reuniu-se, por videoconferência, com a Secretaria da Saúde do estado de Pernambuco, o primeiro a denunciar falta de medicação e onde pacientes já estão com tratamento interrompido, e que constatou várias inconsistências no banco de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), alimentado pelas secretarias estaduais com notificação compulsória de doenças. “Aqui no Cabo de Santo Agostinho, no Centro de Referência Secundária, nunca houve subnotificação. Todas as inconsistências no Sinan do município estão resolvidas. O problema não é recente. Ele se arrasta desde o mês de fevereiro, quando o abastecimento das medicações se tornou irregular. Até culminar neste mês, quando não recebemos mais a PQT. As medicações substitutivas também estão em falta, e são produzidas no Brasil; ou seja, não temos como tratar os pacientes. Estamos recorrendo a medicações de outros agravos, como a tuberculose, para tentar minorar o problema, que é grande”, alerta o médico hansenologista e representante da SBH para a região nordeste, Francisco Almeida.

O Ministério responde, ainda, que até o final de outubro de 2020 foram encaminhadas quantidades de medicamentos para abastecimento de todos os estados. “Se o governo alega subnotificação da doença em Pernambuco, se a medicação é doada pela OMS e se não houve aumento significativo de notificações no estado, não há motivo para os pacientes estarem sem acesso ao tratamento hoje. Além disso, se, como alega o Ministério, houve interrupção de produção de medicamento no final de 2019, as autoridades de saúde deveriam providenciar tratamento substitutivo, cientes de que o paciente não pode interromper o tratamento”, analisa o presidente da SBH. “E mais: por que somos dependentes da doação de medicamentos com patentes expiradas, antigos e de tecnologia aberta para os nossos pacientes? O Brasil deveria estar produzindo tanto os medicamentos básicos da PQT, quanto os substitutivos para os pacientes que não toleram as drogas convencionais ou possuem cepas resistentes aos antibióticos tradicionais. É uma questão de soberania nacional em uma doença tão significativa para nós e para o mundo”, alerta Salgado.

No ofício, assinado pela coordenadora-geral de Vigilância das Doenças em Eliminação, Carmelita Ribeiro Filha Coroliano, falta medicação por problemas técnicos na produção do medicamento e logísticos em virtude da pandemia. Mas o site site Global Partnership for Zero Leprosy (zeroleprosy.org/novartis-kalwe-site-associates-mdt-covid19), que tem a OMS como observador, informa que não houve interrupção na fabricação dos medicamentos.

A SBH aguarda do Ministério da Saúde a apresentação da documentação referente ao último pedido de importação de medicamentos à OMS, bem como o planejamento em virtude do número de casos de hanseníase em tratamento, o quantitativo distribuído aos estados ao longo do ano e a previsão de aumento de notificações pelo fato de o Brasil ser um país de alta endemicidade para a doença.

Redação

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