Às vezes uma simples atitude serve de motivação para que pessoas possam alcançar um objetivo. Em muitas dessas vezes, o intuito é lutar pela própria vida. Nos corredores do Instituto Felício Rocho de Oncologia, em Belo Horizonte (MG), temos um exemplo tão simples, mas de extrema afetividade, que há dois anos sonoriza vitórias.
Trata-se do ritual do sino, tocado por pacientes que realizaram tratamento contra o câncer e aclamam, através das badaladas, por uma nova fase. “A vida é movida por ciclos e a cada vitória temos que comemorar. Por isso, quando seu tratamento terminar, toque este sino com orgulho para todos anunciar”, é a mensagem impressa logo abaixo do artefato.
Os sentimentos despertados ao final da quimioterapia, como a sensação de vitória, de conquista e de superação física e emocional, assim como a gratidão, são lembrados ao tocar o sino. Para a psicóloga do Instituto de Oncologia, Heloísa Alves Chagas, o som ultrapassa o sentido sonoro e possui impacto terapêutico. “Nesse som estão traduzidos o despertar para a vida, o compartilhar a vitória, a motivação para outros pacientes persistirem no tratamento. Nesse ritual, quem toca o sino sente-se protagonista do processo de tratamento, da conquista alcançada, fortalecido pela experiência e pelo apoio recebido”, conta a profissional.
O ecoar das badaladas significa vitória, emoção e comoção. Em junho de 2017, a aposentada de 60 anos, Maria de Lourdes Siman, foi a primeira a tocar o sino e a contar sua história de superação. Acometida por um câncer de mama no início de 2016, a paciente teve a história marcada por perdas relacionadas a doença, mas também de força. Ela foi mais forte, resistiu e, tocou o sino para mostrar sua conquista.
Um ano e meio depois do diagnóstico, Maria de Lourdes fez questão de contar para todos a sua volta por cima. “Eu tive muito sucesso no meu tratamento, fui a primeira a tocar esse sino. Significou uma alegria muito grande. Foi como se fosse uma missão cumprida. Me senti uma pessoa muito importante. Essa foi minha segunda chance. Eu perdi duas irmãs para o câncer e tocar aquele sino só foi a certeza de que eu estava curada e a vida continua”, descreve emocionada.
O “Sino da Vitória”, faz jus ao nome que o acompanha. Até quando o desfecho do tratamento não é exatamente o mais esperado, o ritual tem importante significado. Como o caso da paciente Heloiza Jung. Após cinco anos lutando contra um câncer de mama com metástase, ela faleceu em maio de 2019, aos 53 anos.
Dois dias após a perda, o marido, Henrique Jung, aposentado, de 56 anos, retornou ao hospital com a missão de encerrar o ciclo pela esposa. Ele diz ter tomado a atitude porque simbolizou o descanso para a companheira, com a qual foi 21 anos casado. “Eu acompanhei a minha esposa nos cinco anos de tratamento. A sensação que eu tive foi de alívio e também de agradecimento. Acredito que ela ficou livre do câncer e achei que o sino merecia ser tocado. E também não poderia deixar de agradecer à toda equipe do Hospital Felício Rocho por tanta atenção, toda simpatia e paciência ao longo do processo de tratamento. Era o que a Ló (apelido carinhoso) iria querer”, desabafou. Em um vídeo, Henrique deu seu depoimento e emocionou toda a equipe do hospital, com suas palavras de afeto e gratidão.
Como estas, muitas outras histórias são contadas. “O soar do sino é um sinal. É despertar, é alerta. O ritual de tocar o sino pelo paciente ao final da quimioterapia possui o significado do fechamento de um ciclo. Significa que o paciente está vencendo uma etapa em seu tratamento e seguindo em frente. Não significa necessariamente que o processo de tratamento terminou, pois, o controle com exames ou outros tratamentos complementares ainda poderão existir”, finaliza a psicóloga.