Artigo – A ciência de acreditar

Os médicos, em regra, enfrentam desafios e problemas no dia a dia. Aliás, isso ocorre em qualquer carreira. Normalmente, a primeira coisa que avistamos são os obstáculos para alcançar o objetivo. Peguemos o Brasil como exemplo: a despeito de todas as dificuldades para prática da melhor Medicina, parece haver uma energia maior a nos mover, como um motor domado à vontade e à esperança.

Faço essa reflexão, pois tenho pensado demais sobre o binômio ciência e fé.

A experiência de décadas como médico à beira do leito plantou em mim a quase certeza de que crer é um santo remédio no processo de cura ou para a garantia de mais qualidade de vida, em casos sem retorno.

Em épocas mais primitivas, nas quais havia escassez de estudos e pesquisas, era comum a prática da fé como suposta taboa de salvação para doentes. Aqui e agora, quero polemizar sobre outra face da fé, aquela que baseia na crença em ciência e nas inovações.

A Medicina possui alicerce puramente científico, é praticada por quem segue com convicção a arte de salvar vidas. Os profissionais médicos não poupam esforços para entregar tudo que podem aos pacientes, independentemente do quão difícil seja a situação. É o que vemos hoje, quando, a totalidade deles, expõe a própria saúde no enfrentamento a Covid. Isso é ter propósito humanitário.

Daí ser inadmissível ver o sistema público enfrentar dificuldades recorrentes, como falta de vagas em leitos, de medicamentos, de profissionais e insumos, deixando o médico tão desamparado quanto a população.

Além dos inúmeros complicadores para exercer de forma adequada a profissão para qual dedicou anos de sua vida, ainda enfrenta riscos de acidentes no ambiente de trabalho.

Em cenário tão desfavorável, a fé entra como aliada. Não sob o discutível ângulo milagreiro, mas pelo poder da determinação. Acreditar naquilo que se exerce pode ser além de esperançoso, uma resistência.

É preciso de muita força e ponderação para lidar com dificuldades que envolvem vidas de pessoas. Os valores de cuidado ao próximo são investidos de altruísmo admirável. Para lidar com a pressão e seguir entregando saúde de qualidade, crença é indispensável.

A ciência traz alternativas e soluções, enquanto a fé nos faz manter os pés no chão.

 

 

 

 

Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM)

Redação

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