Artigo – Importância da auditoria internacional para avaliação da qualidade aos fabricantes de IFAs

Ainda hoje as indústrias farmacêuticas, pelo menos as multinacionais, importam seus Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs) e, para isso, designam empresas terceirizadas para produzi-los fora do Brasil – sendo que muitos ainda são insumos farmacêuticos não ativos, porém, logicamente, com a qualidade necessária para assegurar o sucesso de seus produtos, ao introduzi-los no mercado.

Com o advento da globalização em meados da década de 40, surgiram vários fabricantes de IFAs, principalmente na Ásia, diminuindo drasticamente o número de players da antiga cortina de ferro (fabricantes provenientes do leste europeu).

Nos anos 90, na ocasião, teve início um movimento de desconfiança da qualidade dos IFAs, por conta dos preços muito baixos e, consequentemente, desencadeou uma corrida para a compra de matérias-primas baratas visando a redução de custos na fabricação de produtos. Assim, surgiu uma grande competitividade entre as indústrias nacional e a internacional, em nosso país.

No entanto, os resultados dos produtos fabricados inicialmente com essas matérias-primas ficaram aquém e não alcançaram a qualidade esperada. Foi exatamente na década de 2000 que surgiram os genéricos, sendo comercializados a preços muito mais acessíveis e gerando uma verdadeira revolução no mercado farmacêutico brasileiro.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que nasceu em 1999, por sua vez, viu a necessidade de aumentar o rigor na fiscalização dos fabricantes nacionais, em virtude do crescimento das reclamações por parte dos consumidores. Mesmo assim, o custo-benefício foi considerado bom para esse mercado, por um tempo.

Um novo padrão de qualidade para produtos farmacêuticos

Nos anos 70 foi criado o PIC (Pharmaceutical Inspection Convention), pela Associação de Livre Comércio da Europa (EFTA) ao estabelecer uma Convenção de Reconhecimento Mútuo de Inspeção de Fabricantes de Produtos Farmacêuticos, porém o mesmo não foi adotado para o resto do mundo. E, em abril de 1990, surgiu o ICH (Conselho Internacional da Harmonização de Requisitos Técnicos), com as seguintes normas:

  • Q1A – Estabilidade Q1F
  • Validação Analítica Q2
  • Q3A – Impurezas Q3E
  • Q4A – Farmacopéias Q4B
  • Q5A – Q5E Qualidade de Produtos Biotecnológicos
  • Especificações Q6A – Q6B
  • Q7 Boas Práticas de Fabricação
  • Q8 Desenvolvimento Farmacêutico
  • Q9 Gestão de Risco de Qualidade
  • Sistema de Qualidade Farmacêutica Q10
  • Q11 Desenvolvimento e Fabricação de Substâncias Medicinais
  • Q12 Lifecycle Management (Gestão do Ciclo de Vida)
  • Q13 Fabricação Contínua de Substâncias Medicamentosas e Produtos Medicinais
  • Desenvolvimento de Procedimento analítico Q14

O fato é que esses dois adventos começaram a aflorar um padrão diferente de qualidade para os produtos farmacêuticos, inclusive, é claro, aos IFAs. Isto também fez com que as auditorias nas empresas fabricantes de IFAs se tornassem uma rotina e seu grau de exigência passou a ser muito maior.

Neste contexto, a qualidade para os produtos farmacêuticos ganha maior relevância – já que depende dos IFAs. Mais do que aplicar um conceito, torna-se uma realidade a realização de avaliações toxicológicas, rotas de síntese e a adoção de boas práticas para evitar a contaminação cruzada.

Um exemplo é a RDC 210/2003, primeira diretriz de BPF feita pela Anvisa e que, na época, trouxe obrigatoriedade, porém de forma documental (Art. 297). Em substituição à realização de testes de controle de qualidade, o fabricante pode aceitar o certificado de análise emitido pelo fornecedor, desde que a sua confiabilidade seja estabelecida a partir de uma avaliação periódica dos resultados apresentados e de auditorias às suas instalações, o que não exclui a necessidade da realização do teste de identificação DMF (Drug Master File).

Adicionalmente, com aprovação da RDC 17, houve a obrigatoriedade de qualificação contínua e voluntária como especificado no Artigo 2º: quando necessária a realização de auditorias, essas devem comprovar a capacidade do fornecedor em atender aos padrões das BPF.

Por fim, há dois anos (2019), foi necessária a inclusão de uma nova norma, a RDC 301 e mais 14 instruções normativas, separando todas as especificidades como: validação, qualificação, fabricantes de insumos, radiofármacos, aerossóis, produtos biológicos, etc – como já determinado nas normas do PIC e ICH, com foco na qualidade do produto a ser administrado junto aos pacientes.

A evolução da qualificação de fornecedores e sua prioridade

Anteriormente, os fabricantes de IFAs eram qualificados e classificados a partir de um questionário que recebiam. Hoje, todos os fornecedores de Insumos Farmacêuticos Ativos devem ser auditados presencialmente e avaliados dentro dos padrões internacionais.

Com a RDC 301 surge ainda um outro elemento: a análise de risco da atividade, que ganha prioridade já que é onde tudo começa. Após esta análise, o próximo passo é a execução da atividade (analisada) e a gestão do risco. Adicionalmente, é necessário estar atento à integridade dos dados provenientes das documentações auditadas para os processos, análises e liberações de IFAs.

Já as Boas Práticas de Fabricação (BPFs) não serão mais um adendo, mas farão parte do processo de fabricação, análise e distribuição de produtos. Essas boas práticas também assumem uma posição de destaque aqui, levando em consideração todos os pontos mencionados.

A exigência de auditorias presenciais

Podemos concluir que as auditorias presenciais serão parte das rotinas operacionais dos fabricantes de produtos farmacêuticos e para o setor de saúde e, cada vez mais, crescerá o seu rigor – da mesma forma que aumentarão o número de inspetores e auditores especializados, para que o mercado conte com produtos que sejam cada vez melhores e satisfaçam seus consumidores.

Com a impossibilidade de uma auditoria presencial devido a pandemia, abre-se a expectativa da inspeção remota. No entanto, é preciso verificar a integridade dessa auditoria, uma vez que a transmissão de imagem e informação pode ser tendenciosa, a não ser que seja realizada ao vivo e com apoio de pessoal imparcial e competente.

Bárbara Guelfi é fundadora e CEO da Kivalita Consulting

Redação

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