Uma análise econômica do setor de saúde, no contexto da disseminação da Covid-19, traz consigo algumas peculiaridades, já que a crise que vivemos hoje foi deflagrada, justamente, por um problema global relacionado ao setor. Um cenário como o atual não era visto desde a pandemia da gripe espanhola que, estima-se, tenha vitimado mais de 50 milhões de pessoas, em todo o mundo, entre 1918 e 1920. Ao mesmo tempo em que há, hoje, uma diminuição de emprego e de renda em virtude das medidas de isolamento social adotadas para combater a disseminação do coronavírus, também existe, por outro lado, um aumento da consciência em relação aos cuidados com a saúde e a prevenção de doenças.
É neste sentido que o setor – especialmente o segmento da saúde suplementar – apresenta um alto potencial de crescimento para o período pós-pandemia no Brasil. De acordo com o Relatório Setorial da Saúde – Impactos da Covid-19 e Perspectivas, divulgado pela Bateleur Assessoria Financeira, existem boas oportunidades para serem aproveitadas no futuro. “O ambiente se mostra propício à oferta de novas soluções de saúde privada que, ao adotar estruturas de remuneração que alinhem os interesses dos diferentes integrantes do sistema, possam aliar qualidade de atendimento e uma melhor experiência do usuário a uma maior eficiência”, afirma Marcelo Sanvitto, sócio da Bateleur que assina o relatório. “Neste contexto, a adoção de novas tecnologias, incluindo ecossistemas voltados à telemedicina, e a verticalização de players que, atualmente, se encontram em diferentes pontos da cadeia de valor, são tendências pré-existentes e que devem ser aceleradas”, complementa.
O fato de estar no epicentro da pandemia, enfrentando inúmeros desafios, como a falta de equipamentos, a baixa quantidade de testes e as dificuldades em relação ao diagnóstico e ao tratamento dos doentes, não deve afetar as perspectivas de longo prazo do setor. “Este é um segmento de significativa atração de capital de investidores nacionais e estrangeiros. O atual cenário, com restrito espaço fiscal para investimento governamental, apresentará relevantes oportunidades para os players que se dedicarem a melhorar a experiência do usuário e elevar o nível de eficiência da saúde suplementar”, afirma Sanvitto.
Principais perspectivas
A exemplo de outros relatórios que vêm sendo divulgados pela Bateleur Assessoria Financeira desde maio, o estudo voltado à área da saúde começa com uma contextualização de cenário baseada em dados da Agência Nacional de Saúde (ANS), IBGE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Datafolha, PwC, Aon, McKinsey, Insper e Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS). Na sequência, após analisar as principais tendências e discutir os impactos da pandemia de Covid-19, o relatório aponta as perspectivas em relação aos seguintes assuntos: saúde e prevenção; telemedicina; e-health; consolidação e verticalização; clínicas populares; e acesso à saúde e inflação médica. Confira, abaixo, uma síntese de cada uma dessas perspectivas.
Saúde e prevenção: adoção de novos hábitos
No longo prazo, a pandemia da Covid-19 deve trazer uma forte mudança de hábitos, com a introdução de novas práticas de higiene e prevenção – o uso de máscaras, a lavagem constante das mãos e a utilização de álcool em gel são alguns exemplos. Além de uma melhora na qualidade de vida, eles podem trazer um impacto positivo na redução de sinistralidade para as operadoras de saúde, como resultado da diminuição no número de atendimentos com doenças que poderão ser evitadas. No caso dos prestadores de serviços, o impacto seria o inverso, com menor procura por consultas, exames e tratamentos.
Telemedicina: ampliação das consultas a distância
A pandemia obrigou o Brasil a experimentar, com mais intensidade, a prática da telemedicina, um recurso muito utilizado em todo o mundo para facilitar a vida dos pacientes e reduzir os custos médico-hospitalares. No médio prazo, dado que as preocupações acerca da Covid-19 permanecerão até que se tenha uma vacina ou um tratamento eficaz, a demanda por consultas a distância tende a se manter elevada, criando um cenário mais propício à adaptação da regulamentação dessa modalidade de atendimento.
E-Health: todos os dados do paciente em um só lugar
No caso da saúde, a jornada do paciente ainda é muito insatisfatória na maioria dos casos, sendo necessário, muitas vezes, realizar o agendamento em diferentes canais, bem como executar exames e procedimentos desnecessários ou repeti-los, uma vez que suas informações e histórico de saúde não estão integrados em uma só plataforma. Uma das principais oportunidades do cenário pós-pandemia é o desenvolvimento dos serviços de e-Health, que reúnem, em um só lugar, todas as informações sobre consultas, exames, internações e histórico dos pacientes.
Consolidação e verticalização: a reorganização do mercado
Como normalmente ocorre em crises, a pandemia deve ser um fator propulsor de dois processos no âmbito da saúde complementar: a consolidação (movimento no qual os players menores saem do mercado ou são absorvidos em processos de fusão e aquisição) e a verticalização (quando as empresas ampliam as suas áreas de atuação, assumindo funções que antes eram delegadas, por exemplo, a prestadores de serviço).
Acesso à saúde e inflação médica: novos formatos de planos privados
Com o aumento do desemprego, e possível encerramento de operações de diversas empresas em diferentes setores ocorrendo na esteira da crise, deve surgir uma grande demanda de pessoas querendo acessar o sistema privado de saúde de outras maneiras, o que pode criar oportunidades para as empresas do setor. Uma delas seria a criação de planos individuais mais acessíveis ou novos formatos de planos coletivos.
Clínicas populares: uma alternativa para a demanda de baixa complexidade
Outro caminho possível para oferecer uma alternativa às pessoas não cobertas por planos de saúde serão as clínicas populares. Esse tipo de prestador de serviços de baixa complexidade pode vir a experienciar um grande potencial de crescimento após a crise, dado que compete com o SUS justamente no segmento da atenção básica, no qual o serviço público apresenta baixo nível de disponibilidade e, por consequência, de satisfação.