Sociedades médicas que atuam no cuidado oncológico publicam carta aberta em defesa de caráter não restritivo do Rol da ANS

Nesta quarta-feira (8) acontecerá o retorno do julgamento pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que analisa se o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) será exemplificativo ou taxativo. Em decorrência da discussão, sete sociedades brasileiras que atuam no cuidado oncológico publicaram uma carta aberta em defesa de caráter não restritivo do Rol. São elas: Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO); Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC); Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT); Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR); Sociedade Brasileira de Patologia (SBP); Sociedade Brasileira de Radiologia Intervencionista e Cirurgia Endovascular (SOBRICE) e a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN).

De acordo com definição da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde garante e torna público o direito assistencial dos beneficiários dos respectivos planos, contemplando procedimentos considerados indispensáveis ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento de doenças, em cumprimento ao disposto na Lei nº 9.656, de 1998. O Rol é considerado taxativo quando há uma lista definitiva (limitada) de procedimentos que devem ser, obrigatoriamente, oferecidos pelas operadoras privadas de saúde; e exemplificativo quando leva em consideração apenas uma amostra com alguns exemplos dos itens que devem ser pagos pelos planos, podendo haver outros fora da lista que também devam ser cobertos.

Em sua última atualização, vigente entre 02/01/2018 a 31/03/2021, o Rol da ANS estabeleceu o direito à cobertura para 18 novos procedimentos, entre exames, terapias e cirurgias, que atendem diferentes especialidades, e a ampliação de cobertura para outros 7 procedimentos, incluindo medicamentos orais contra o câncer. Mas, mesmo com essa revisão, o processo de incorporação no Rol está em descompasso com a produção científica em oncologia – o que impacta no acesso dos pacientes aos procedimentos que reúnem evidências consolidadas.

Quando um paciente recebe o diagnóstico de câncer, o tempo é crucial. Embora tumores mais indolentes permitam uma janela de tempo em que a falta de acesso imediato ao tratamento não impacte em sua qualidade de vida, na maioria dos casos, a doença tem um comportamento agressivo e a falta de cobertura reflete, diretamente, na piora da doença. Outro agravante é que, além da demora na incorporação de novos medicamentos, há também a ausência de incorporações relacionadas à cirurgia e à radioterapia. Uma possível votação a favor do Rol taxativo é motivo de preocupação, pois pode resultar em maior obstáculo para que os pacientes, mesmo com evidência científica e laudo médico em mãos, consigam obter procedimentos requeridos na justiça.

A decisão sobre a mudança, que estava com pedido de vista coletiva desde fevereiro deste ano, é muito aguardada, pois já poderá ser utilizada por tribunais ordinários dando base para futuros julgamentos.

Confira na íntegra a carta assinada pelas sete sociedades:

Rol da ANS: taxativo ou exemplificativo?

Posicionamento conjunto das Sociedades Brasileiras Da Linha de Cuidado Oncológico

Está em debate no Superior Tribunal de Justiça (STJ), corte responsável por uniformizar a interpretação da lei federal em todo o território nacional, dois recursos que avaliam se o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem caráter taxativo ou exemplificativo.

O rol da ANS é uma lista com diversos tipos de medicamentos e procedimentos – muitos deles fundamentais para o controle ou até cura do câncer – que os planos de saúde devem cobrir. Ele é considerado taxativo quando há uma lista definitiva (limitada) de procedimentos que devem ser, obrigatoriamente, oferecidos pelas operadoras privadas de saúde; e exemplificativo quando leva em consideração apenas uma amostra com alguns exemplos dos itens que devem ser pagos pelos planos de saúde, podendo haver outros fora da lista que tenham que ser cobertos.

As entidades signatárias desta carta, nomeadamente Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO); Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC); Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT); Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR); Sociedade Brasileira de Patologia (SBP); Sociedade Brasileira de Radiologia Intervencionista e Cirurgia Endovascular (SOBRICE) e Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN) acompanham atentamente as discussões sobre os julgamentos de recursos de pacientes de planos de saúde que  tiveram partes da cobertura dos seus tratamentos negadas por não constarem no rol da ANS.

De acordo com esses recursos, foram consideradas abusivas as cláusulas contratuais que excluíram procedimentos prescritos pelo médico. Segundo essa interpretação, a rejeição a qualquer procedimento recomendado por um médico caracterizaria conduta abusiva das operadoras de planos de saúde, ainda que não previsto no contrato de seguro e no rol da ANS. Isso porque a essência do contrato de plano de saúde seria assegurar o cuidado necessário para a recuperação do paciente. Dessa forma, a lista da agência reguladora seria exemplificativa.

Por outro lado, a ANS e as operadoras dos planos de saúde defendem o caráter taxativo, ou exaustivo, do rol, baseando-se no entendimento do plano de saúde como um contrato, com o pagamento da importância devida, a oferta de garantias na eventual ocorrência de sinistro e o reconhecimento da existência de um risco estimado. A equivalência entre esses elementos contratuais garantiria a sustentabilidade do sistema de saúde suplementar.

Na prática, o rol da ANS tem sido considerado taxativo pelo órgão regulador e os planos têm    se negado, frequentemente, a oferecer tratamentos e tecnologias que não constem dele, o que não  raro leva pacientes à judicialização. Por outro lado, o entendimento histórico dos tribunais do país, que são predominantemente favoráveis a uma interpretação mais ampla, considera a lista de procedimentos como referência exemplificativa. A maioria deles possui jurisprudência consolidada em favor de um rol exemplificativo. A decisão do STJ que está em debate, no entanto, pode alterar essa realidade.

Sendo assim, estas Sociedades Médicas reafirmam sua defesa histórica por processos decisórios que privilegiem o profissional médico da saúde suplementar e seus pacientes que não podem esperar por longos períodos até que o cuidado de que necessitam seja oferecido. Viemos de   um trabalho de longa data pela defesa de melhorias no rol da ANS, para que sua revisão e atualização ocorra de forma célere para atender as necessidades dos pacientes assistidos pelos planos de saúde brasileiros. Igualmente, a defesa dessa celeridade nunca prescindiu da avaliação de tecnologias em saúde (ATS), e nossos especialistas têm participado ativamente dos processos de incorporações de tecnologias ao rol fornecendo as melhores evidências científicas para as tomadas de decisão por parte dos gestores públicos.

Nos manifestamos pela ampliação da discussão a respeito desta interpretação jurídica e firmamos posição em defesa de caráter não restritivo, podendo este servir como um balizador de condutas e nunca como um limite pétreo do cuidado. Reconhecemos a necessidade da sustentabilidade do sistema de saúde suplementar e, por isso, sugerimos que o STJ module sua decisão, legitimando a realidade atual: rol deve ser prestigiado sempre que possível e sua atualização deve ser mais célere e com a discussão técnica com as Sociedades de Especialidades.  No entanto, se a via judicial for a saída encontrada pelo paciente para assegurar seu acesso ao tratamento recomendado pelo seu médico, que o juiz possa analisar caso a caso, podendo entender que em determinadas situações, a ANS não deu a resposta mais adequada para a sociedade.

Para os profissionais médicos, pacientes e seus familiares saberem da existência de excelentes recursos contra o câncer e não poderem utilizá-los, simplesmente por imposições de padrões administrativos, deslegitimadas pela comunidade médica, não deixa de ser um  cerceamento de direitos.

Dr. Héber Salvador de Castro Ribeiro

Presidente da SBCO – Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica 2021 – 2023

Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff

Presidente da SBOC -Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica 2021-2023

Dr. Marcus Simões Castilho

Presidente da SBRT – Sociedade Brasileira de Radioterapia 2021-2023

Dr. Valdair Francisco Muglia

Presidente Colégio Brasileiro de Radiologia 2021-2022

Dra. Katia Ramos Moreira Leite

Presidente da SBP – Sociedade Brasileira de Patologia 2020-2022

Redação

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