The Lancet publica estudo brasileiro que pode reduzir mortes de pacientes internados por Covid

Foi publicado no dia 15 de dezembro, na The Lancet, uma das mais reconhecidas revistas científicas do mundo, um estudo conduzido por 26 cientistas brasileiros que mostra que as mortes de pacientes internados por Covid-19, que apresentam risco alto de tromboembolismo na alta médica, podem ser reduzidas em 67%. O estudo é apontado como um divisor de águas na tomada de decisão médica sobre o tema.

A motivação do estudo, patrocinado pela Science Valley Research Institute, empresa global de inteligência em pesquisa clínica e pesquisa e desenvolvimento na área de saúde, está ligada ao fato de que eventos trombóticos associados à internação por Covid-19 é cada vez mais diagnosticada. Segundo uma pesquisa realizada pela Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular (SBACV), 39% dos médicos entrevistados atenderam ao menos um paciente com Covid-19 que desenvolveu trombose no período da pandemia.

Os resultados da análise de dados do estudo The Michelle Trial foram inicialmente apresentados em agosto, no Congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC, do inglês European Society Cardiology). A pesquisa foi realizada de forma inédita em vários centros de pesquisa do Brasil, contemplando a segurança e a eficácia do medicamento Xarelto®️ (rivaroxabana) de 10 mg, uma vez ao dia, no período pós internação em pacientes que foram hospitalizados por Covid-19 e com risco alto de tromboembolismo na alta.

Liderado pelo co-fundador e presidente do Conselho de Diretores da Science Valley, Dr. Eduardo Ramacciotti, o estudo randomizado, prospectivo e controlado tem o potencial de ser um divisor de águas na tomada de decisão médica e coloca o Brasil em evidência no campo de pesquisa. Isso porque o estudo demonstrou uma redução relativa do risco de trombose (particularmente de sua forma mais grave, a embolia pulmonar) em pacientes internados por Covid-19 que fizeram uso profilático de Xarelto®️ (rivaroxabana) por 35 dias após alta hospitalar. Com resultados promissores, os dados comprovam que pacientes que utilizaram a droga tiveram três vezes menos risco de desenvolver trombose venosa profunda, em comparação com pacientes que não fizeram uso do medicamento. Durante a pesquisa, foram analisados 320 pacientes que estavam internados por Covid-19 e receberam a profilaxia padrão com enoxaparina ou heparina durante a internação. Para participar do estudo, eles precisavam ter mais de 18 anos e estar pelo menos três dias internados no hospital. Antes da alta hospitalar, o risco de desenvolver trombose nos membros inferiores e/ou embolia pulmonar foi avaliado através de um escore IMPROVE. Caso fosse detectado um risco aumentado para evento tromboembólico com baixo risco de sangramento no momento da alta hospitalar, os pacientes eram randomizados para receber Xarelto®️ (rivaroxabana) ou não fazer uso do anticoagulante.

O Dr. Ramacciotti explica que, por ser uma doença respiratória inflamatória causada pelo vírus SARS-CoV-2, a Covid-19 leva a um risco aumentado de tromboembolismo venoso (TEV) em pessoas que tiveram a doença – especialmente as que apresentaram um quadro mais grave durante a internação. “O que acontece é que, mesmo com esse risco aumentado, não existem novas diretrizes incorporadas aos tratamentos atuais e nem evidências do melhor regime de dosagem ou consenso sobre o papel da profilaxia estendida para TEV. O estudo avalia justamente, para esses casos, se o Xarelto®️ seria uma opção eficaz e segura”, afirma. “Os médicos já sabem que a Covid-19 causa alterações no organismo, como processo inflamatório e coagulopatia. Agora é preciso buscar o melhor tratamento para essa população de pacientes”, complementa.

Os pacientes que participaram do estudo tinham em média 57 anos, tiveram uma média de 16 dias hospitalizados e 54,1% passaram pela UTI.  Isso significa que cerca de metade dos pacientes analisados tinha um quadro clínico mais grave e com maiores chances de desenvolver trombose de membros inferiores, incluindo embolia pulmonar. Todos eles foram acompanhados até o dia 35 do estudo, quando então eram submetidos à uma ultrassonografia com Doppler dos membros inferiores e à angiotomografia pulmonar. O risco de sangramento maior também foi avaliado, pois é a complicação mais frequente com o uso de anticoagulantes.

O estudo mostrou também que o uso de Xarelto®️ (rivaroxabana) como profilaxia estendida não provocou um aumento do sangramento nessa população criteriosamente selecionada. “Acreditamos que o resultado promissor que obtivemos com o estudo pode ser considerado o primeiro passo para uma melhor tomada de decisão clínica, a fim de diminuir os casos de trombose em pacientes que se recuperaram da Covid-19 e já tiveram alta hospitalar. É importante que os médicos fiquem atentos aos sinais, características e quadro clínico do paciente, encarando-os de forma individualizada, visto que os resultados positivos são referentes a características específicas do paciente, com ressalvas no risco de sangramento, medicações concomitantes e clearance de creatinina menor que 30, por exemplo”, diz o Dr. Ramacciotti.

O pesquisador e cirurgião vascular reforça que, como qualquer outro medicamento, o uso de Xarelto®️ (rivaroxabana) deve ser feito mediante prescrição médica, dentro do que está aprovado em bula no Brasil. “Vale ressaltar que não está claro ainda se as anormalidades da coagulação ocorrem devido ao efeito direto do SARS-CoV-2 ou indiretamente pelo aumento de fatores inflamatórios, lesão dos vasos sanguíneos, ou por uma combinação de mecanismos. Atualmente, há uma indicação clara de tromboprofilaxia farmacológica intra-hospitalar para cada paciente com Covid-19 após a avaliação do risco de sangramento”, explica. “O que o estudo Michelle trouxe foi identificar o paciente que pode se beneficiar da profilaxia após a alta hospitalar com a dose e o tempo certo de profilaxia reduzindo assim, de forma significativa, os eventos tromboembólicos e as complicações pós internação por Covid-19”, finaliza.

Além do Dr. Ramacciotti, MD, Ph.D, assinam o estudo Leandro Barile Agati, Ph.D, Daniela Calderaro, MD, Ph.D, Valéria Cristina Resende Aguiar, MD, Giuliano Giova Volpiani, MD, Caroline Candida Carvalho de Oliveira, MD, Elizabeth Rodrigues. Ph.D, Marcone Lima Sobreira, MD, Ph.D, Edwaldo Edner Joviliano, MD, Ph.D, Cesar Dusilek, MD, Kengi Itinose, MD, Rogério Aparecido Dedivitis, MD, Ph.D, André Sementilli Cortina, MD, Suzanna Maria Viana Sanches, MD, Nara Franzin de Moraes, MD, Paulo Fernando Guimarães Morando Marzocchi Tierno MD, André Luiz Malavasi Longo de Oliveira, MD, Adriano Tachibana, MD, Ph.D,  Rodrigo Caruso Chate, MD, Ph.D, Marcus Vinícius Barbosa Santos, MD, Bruno Bezerra de Menezes Cavalcante, MD,  Ricardo Cesar Rocha Moreira, MD, Chang Chiann, Ph.D, Alfonso Tafur, MD, Alex C. Spyropoulos, MD, Renato D. Lopes, MD, Ph.D.

Redação

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